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Perdão – a essência do evangelho

Atualizado: 8 de jul. de 2021


Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade; suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos uns aos outros, se alguém tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou, assim fazei vós também. (Cl 3:12,13)

  1. S. Lewis disse que é mais fácil falar sobre perdão do que perdoar. Sim, é mais fácil eu falar sobre perdão até ter alguém a quem eu precise perdoar. Amar a todos é fácil, o desafio é amar quem nos persegue. Alguém disse: “Eu amo a humanidade; o que eu não tolero são as pessoas”. Isso é um fato: decepcionamos as pessoas e as pessoas nos decepcionam. As pessoas são ladras da nossa alegria. Sofremos mais por causa das pessoas do que pelas circunstâncias adversas.

Vivemos num mundo ferido, doente e cheio de mágoas entre as nações, tribos, famílias. Hoje o divórcio já atinge 50% dos casamentos. O divórcio é fruto da dureza de coração, ou seja, da incapacidade de perdoar. Aliás, o pecado mais presente na igreja é o da mágoa – essa se espalha muito, vira fofoca e contamina toda a igreja, gerando divisões.

Certo pastor foi pregar numa igreja do Estado de São Paulo. O pastor local disse que estava preocupado, pois fazia dois anos que não havia mais conversões. No culto da manhã, o pastor visitante pregou sobre perdão. Houve um quebrantamento e, especialmente, duas irmãs de influência na igreja se reconciliaram. Resultado: no culto da noite houve 15 conversões.

Muitos cristãos têm dificuldades em crescer espiritualmente e frutificar, trazer almas para Jesus porque tropeçam no perdão. Mas como podem pregar o evangelho se ainda estão presos por mágoas, por falta de perdão? É uma contradição à essência do evangelho, que é o perdão!

Deus estava em Cristo reconciliando consigo mesmo o mundo, não levando em conta as transgressões dos homens; e nos encarregou da mensagem da reconciliação. (2 Co 5.19).

O sacrifício de Jesus foi exatamente para promover o perdão de Deus a nós. Desta forma, como é que eu vou compartilhar o evangelho com alguém se eu não perdoo aos que me ofenderam? Jesus disse: “Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.” (Jo 8:36). Deus quer que eu e você sejamos totalmente livres – livres para perdoar e pedir perdão, livres de todo tipo de amargura.

Às vezes não é fácil perdoar ou pedir perdão, pois ambos exigem abandonar o orgulho próprio. É por isso que Jesus nos exortou: “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma.” (Mt 11.29). Quem não perdoa adoece e não encontra descanso na alma.

Uma jovem seminarista tinha muitas dores e grande perda de sangue cada vez que menstruava. Os pais já a haviam levado para fazer todos os exames possíveis e nada havia sido constatado. A esposa do pastor diretor do seminário teve uma longa conversa com a moça, que acabou revelando que na adolescência havia sido abusada por um ginecologista quando em consulta. O médico só não consumou o estupro porque ela estava menstruando naquele dia. Ela, então, entendeu que precisava perdoar o médico. Oraram, ela liberou o perdão e, a partir daquele dia, não mais teve problemas com a menstruação. É fato comprovado que inúmeras doenças são causadas pela falta de perdão.

Esta semana eu li em um jornal muito conhecido (BBC) uma história ocorrida há 6 anos. Uma senhora (Nancy Shore) foi assaltada quando voltava de um culto da igreja. O ladrão estava armado e deu um tiro na cabeça dela. Ainda sóbria, ela gritou: “Jesus, me salva.” Depois de um tempo, ela acordou e ouviu Jesus lhe dizer: “Levante e peça socorro.” Mesmo sangrando muito (ela perdeu um olho), conseguiu chamar por socorro. Quando estava no hospital, ela recebeu a visita do marido. Era uma família cristã, mais de 20 anos de casados, três filhos, tinham reuniões de estudo bíblico em sua casa, o pai era muito envolvido com os filhos etc. Então o marido lhe disse: “Olha, eu já estou há 3 anos em um outro relacionamento e quero me separar de você.” Momentos depois, chegou um policial e comunicou a ela que haviam prendido a pessoa que havia mandado matá-la: era o seu próprio marido. Aquilo foi algo devastador para ela. Além do adultério, ele havia se envolvido com dívidas e roubos de clientes.

Este fato aconteceu há 6 anos no Texas-EUA, e ele foi julgado e condenado à prisão perpétua. Ela disse, naquela ocasião, que o mais devastador para ela foi o adultério – até mais do que a tentativa de matá-la. Isso porque ela havia feito um compromisso com Deus de que nunca aceitaria um divórcio. Ela chegou a divorciar, mas no próprio julgamento ela lhe ofereceu perdão e estava disposta a voltar atrás se ele quisesse, mesmo sabendo que ele teria de passar no mínimo 30 anos na prisão para ter direito à liberdade condicional; então, quando saísse, teria 85 anos.

No relato ao repórter, ela disse: “Eu o perdoei. A Bíblia diz que se não perdoarmos aqueles que nos prejudicaram, não poderemos ser perdoados. Então, eu não posso me dar ao luxo de não perdoá-lo, porque não posso viver com amargura.” No julgamento, os filhos não acreditaram no que o pai havia feito e saíram pensando que fora condenado injustamente. Levou mais de um mês para que voltassem a conversar com a mãe. Mas ela disse ao repórter: “Eu sou grata a Deus por ter salvado a minha vida e pela cura que está acontecendo na vida de meus filhos. É incrível, mas estou extremamente feliz.” Ela canta no coral da igreja da qual faz parte, em Carrollton, Texas.

Um outro caso muito forte foi de uma jovem chamada Vanessa Chaves de Altônia-PR. Aos 12 anos ela viu o pai assassinar sua mãe, que deu o último suspiro em seus braços. Não sendo cristã, começou a ter vários envolvimentos errados e aos 16 anos provocou um aborto. Sua vida foi de mal a pior, até que um dia ela teve um encontro com Jesus e sua vida mudou.

Contando sua história em um livro, ela disse que, após caminhar um tempo com o Senhor, Ele lhe disse que havia chegado a hora dela procurar seu pai e lhe pedir perdão. Mas ela dizia: “Como isso? Ele é um assassino, ele matou a minha mãe!” E Deus lhe falou: “Mas você carrega um ódio por ele. Então, precisa perdoá-lo e também pedir perdão a ele.” Ela relatou que esse processo durou aproximadamente 1 ano, até que conseguiu fazê-lo. Daquele dia em diante, passou a sentir um grande amor pelo pai – o amor de Jesus.

Eu creio que Deus está chamando a nossa atenção para essa questão, pois, ao longo da história da Igreja, mesmo com inúmeras divisões, contendas, mágoas e ódios, quase não se falou sobre o perdão. Grande parte da literatura cristã escrita pelos grandes teólogos não toca no assunto do perdão relacional, entre as pessoas, mas somente do perdão de Deus pelos nossos pecados. Mas esse é um assunto extremamente importante, necessário e urgente para todos nós.

Vimos, mediante esses testemunhos acima, que a presença de Jesus é o que fez a grande diferença na vida delas. Isso nos leva a pensar o seguinte: é possível e correto a um verdadeiro cristão não praticar o perdão com as pessoas? Eu acredito que não! Inclusive, podemos até questionar se essa pessoa realmente teve um encontro real com Jesus, pois a essência do evangelho é o perdão. Você só é cristão se entendeu e recebeu o perdão de Deus em sua vida por meio do sacrifício de Jesus na cruz.

É até possível que, devido a questões culturais ou situações diversas, mesmo tendo tido uma experiência com Deus, possamos ainda alimentar mágoas por algumas pessoas. Mas a Palavra de Deus nos ensina e capacita a exercer este perdão. E mais: nós TEMOS DE PERDOAR, pois foi uma ordem de Jesus, uma condição para entrarmos no seu Reino:

Quando estiverdes orando, se tendes alguma coisa contra alguém, perdoai, para que também o vosso Pai que está no céu vos perdoe as vossas ofensas. Mas, se não perdoardes, também vosso Pai, que está no céu, não vos perdoará as vossas ofensas. (Mr 11.25,26)

Toda amargura, cólera, ira, gritaria e blasfêmia sejam eliminadas do meio de vós, bem como toda maldade. Pelo contrário, sede bondosos e tende compaixão uns para com os outros, perdoando uns aos outros, assim como Deus vos perdoou em Cristo. (Ef 4.31,32)

Nós podemos, devemos e temos todas as condições dadas por Deus para exercermos o perdão uns aos outros. Deus nos deu uma ordem, mas também nos deu a graça e as condições para obedecer. O que precisamos, então, é sermos convencidos pelo Espírito Santo que NÃO PERDOAR É PECADO.

Ouvi um tio da minha esposa dizer que as pessoas, às vezes, estão presas a um determinado vício e ficam anos e anos nessa situação. Mas, quando se convencem de que aquilo é pecado, elas podem e conseguem ser libertas. Repetindo, então, NÃO PERDOAR É PECADO.

Em uma das minhas pregações em 2016, contei o testemunho da irmã Corrie Ten Boom, uma escritora holandesa cristã que ajudou a salvar a vida de muitos judeus ao escondê-los dos nazistas durante a II Guerra Mundial e que, juntamente com sua família, foi enviada para um campo de concentração. Tendo sobrevivido, tornou-se uma pregadora do evangelho. Em 1947, durante uma pregação em Munique, ela relatou a seguinte história:

Foi numa igreja em Munique, onde eu estava pregando em 1947, que, de repente, o vislumbrei: um homem calvo, troncudo vestindo um sobretudo cinza, com um chapéu de feltro marrom amassado entre as duas mãos. Num instante, estava enxergando o sobretudo e o chapéu marrom; no instante seguinte, o uniforme azul, o quepe estampado com a caveira e as duas tíbias cruzadas, o rosto malicioso, lascivo, debochado.

Minhas lembranças do campo de concentração voltaram com rapidez e impacto: a sala enorme com as severas luminárias no teto, a pilha patética de vestidos e sapatos no centro, a vergonha de ter de passar nua diante desse homem. Pude ver o vulto frágil da minha irmã à minha frente, costelas quase furando o fino pergaminho da sua pele. Betsie e eu havíamos sido presas por termos escondido judeus na nossa casa por ocasião da ocupação nazista da Holanda, durante a Segunda Guerra. Esse homem fora um dos guardas no campo de concentração em Ravensbruck, para onde fomos enviadas. Agora, ele estava diante de mim, mão estendida: “Que bela mensagem, fräulein! Que bom saber, como disse, que nossos pecados estão todos no fundo do mar!” Pela primeira vez, desde minha soltura, eu estava frente a frente com um dos meus algozes, e meu sangue parecia ter congelado.

“Você mencionou Ravensbruck na sua palestra”, ele dizia. “Fui guarda lá. Mas depois disso”, continuou, “tornei-me cristão. Eu sei que Deus me perdoou pelas coisas cruéis que cometi lá, mas eu gostaria de ouvi-lo da sua boca também. Fräulein”, com a mão estendida outra vez, “você me perdoa?”

Fiquei ali paralisada. Eu não podia fazer isso. Minha irmã Betsie morrera naquele lugar; será que ele podia apagar sua morte terrível e prolongada, simplesmente porque pedia perdão? Eu achava que já perdoara a todos; pregava sobre isso por toda parte. Eu, o exemplo de perdão, não conseguia perdoar quando encarava meu ofensor em carne e osso. Não podem ter passado mais do que alguns segundos, ele em pé com a mão estendida – mas para mim parecia uma batalha de horas, enquanto eu enfrentava a coisa mais difícil que tive de fazer em toda minha vida.

Eu não tinha opção – eu sabia disso. A mensagem do perdão de Deus possui um pré-requisito: que perdoemos a todos que nos feriram. “Se não perdoardes aos homens”, afirmou Jesus, “tão pouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas” (Mt 6.15). Ainda assim, lá estava eu com o coração dominado por frieza. Entretanto, perdoar é um ato da vontade, e a vontade pode funcionar indiferentemente da temperatura do coração. Entendi que não perdoar é pecado, pois é como se precisasse algo mais do que Jesus fez na cruz pela pessoa.   “Jesus, ajuda-me”, supliquei silenciosamente. “Dá-me o Teu perdão.  Eu posso levantar minha mão. Pelo menos isso, posso fazer. Dá-me o sentimento depois.”

Então, sentindo-me um robô, coloquei minha mão mecanicamente na mão que me estava estendida. E, enquanto o fiz, algo incrível aconteceu. Uma corrente começou no meu ombro, correu pelo meu braço e saltou para nossas mãos unidas. Em seguida, esse calor restaurador parecia inundar todo o meu ser, trazendo lágrimas aos meus olhos.

“Eu te perdoo, irmão”, exclamei, “com todo o meu coração!” Por um longo instante, seguramos a mão um do outro, o ex-guarda e a ex-prisioneira. Posso dizer que nunca experimentei o amor de Deus de forma tão intensa como naquele momento.

(Testemunho publicado originalmente na revista “Guideposts”, 1972. A história de Corrie Ten Boom foi relatada no famoso livro e filme “Refúgio Secreto”, de John e Elizabeth Sherrill, Editora Betânia).

Qual a grande lição desses testemunhos? Que quando alguém recebe o perdão do Pai, reconhece e confessa suas mágoas, também consegue liberar o perdão aos que lhe feriram e passa a amar essas pessoas por causa do amor de Jesus que agora habita em seu coração. É o perdão de Deus que nos capacita a perdoar!

Outra linda história que li recentemente também ocorreu durante a II Guerra. No dia 7 de dezembro de 1941, Mitsuo Fuchida comandou o ataque japonês à frota americana em Pearl Harbour (21 navios e 347 aviões foram destruídos, matando cerca de 2403 pessoas e ferindo outras 1178). Jacob DeShazer, oficial americano, se propôs a vingar esse acontecimento e, depois, participou do bombardeio de Nagoya. Seu avião, no entanto, foi abatido. Ele foi preso pelos japoneses em Tóquio e torturado durante dois anos. Na prisão, converteu-se lendo a Bíblia, em especial o texto que fala: “Pai, perdoa-lhes por que não sabem o que fazem”. Aquele ódio que ele sentia pelos japoneses foi arrancado do seu coração pelo Espírito Santo e ele passou a amar aqueles guardas que, por causa disso, também passaram a tratá-lo bem.

Após a Guerra, tendo voltado aos Estados Unidos, preparou-se em um Seminário e voltou para o Japão como missionário, fundando uma igreja na mesma cidade que havia sido bombardeada e ali serviu ao Senhor por 29 anos. Lá permaneceu até 2008, quando faleceu aos 95 anos. Logo nos primeiros anos, realizou inúmeras campanhas e milhares de pessoas se converteram. Como ele tinha se convertido numa prisão ali mesmo no Japão, sempre relatava seu testemunho sobre isso e, também, escreveu sua história em um folheto que se espalhou por muitas regiões.

Fuchida, o comandante que havia idealizado aquele ataque, após a Guerra foi chamado para ser julgado pelos seus crimes. Ele ficou furioso com isso, pois havia um código entre os samurais que, no caso de vencer uma batalha, eles teriam o direito de fazer o que quisessem com os derrotados – inclusive torturar e matar. Ele disse: “Mas como eu estou sendo julgado por isso? Os americanos também fizeram o mesmo!” Então ele foi procurar saber, junto a outros sobreviventes, como eles haviam sido tratados nas prisões americanas – e esses lhe testemunharam que nunca foram torturados, mas sempre muito bem tratados. Inclusive, alguém lhe disse que havia uma moça que o tratava muito bem, amorosamente, cujos pais haviam sido mortos pelos soldados japoneses.

Isso passou a incomodar a mente de Fuchida. Dias depois, chegou às suas mãos o folheto da experiência de DeShazer. Ele também começou a ler a Bíblia e se converteu ao Senhor. O texto que mais lhe tocou foi a frase de Jesus na cruz: “Pai, perdoa-lhes, porque eles não sabem o que fazem.” (Lc 23.34). Ele disse: “Deus, esse sou eu. Eu não sabia a besteira que estava fazendo naquele dia!” Então ele encontrou o perdão e a reconciliação com Deus.

Após um tempo, Fuchida se encontrou com DeShazer, praticaram o perdão entre eles e ambos pregaram em praças públicas no Japão, juntos e reconciliados. Depois de preparar-se melhor, foi para os Estados Unidos onde, por 15 anos, testemunhou da sua conversão e do seu erro de ter bombardeado Pearl Harbour.

Esse é o poder do perdão que reconcilia; essa é a grande diferença que a presença de Jesus faz em nossas vidas. “Dar o troco” é algo natural, inerente ao ser humano. Perdoar, porém, é antinatural; é uma ação divina no coração humano. Esses testemunhos mostram pessoas que, mesmo responsáveis pela morte de inúmeras outras se arrependeram, foram perdoadas e receberam uma nova vida em Jesus. Esse é o verdadeiro evangelho.

Então, como santos e amados eleitos de Deus, revesti-vos de um coração cheio de compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência, suportando e perdoando uns aos outros; se alguém tiver alguma queixa contra o outro, assim como o Senhor vos perdoou, também perdoai. (Cl 2.12,13)

Esse é o nosso Deus, que nos tirou do reino das trevas e nos transportou para o Reino do Filho do Seu amor (Cl 1.13). Esse é o Deus que nos perdoou e nos ordenou e capacitou a fazer o mesmo.

Amados, nunca se vinguem; deixem que a ira de Deus se encarregue disso, pois assim dizem as Escrituras: “A vingança cabe a mim, eu lhes darei o troco, diz o Senhor”. Pelo contrário: “Se seu inimigo estiver com fome, dê-lhe de comer; se estiver com sede, dê-lhe de beber. Ao fazer isso, amontoará brasas vivas sobre a cabeça dele“. Não deixem que o mal os vença, mas vençam o mal praticando o bem. (Rm 12.19-21)

Paulo está citando uma lei do Velho Testamento, uma ordem expressa de Deus: NÃO SE VINGUE! Às vezes eu digo que “crente não se vinga; ele apenas quer que Deus dê o troco!” Mas essa não é a atitude de Jesus e de um cristão.

Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus (Mt 5.44).

Em Provérbios 25.22, há um pequeno complemento ao texto citado por Paulo em Romanos: “Você amontoará brasas vivas sobre a cabeça deles, e o Senhor o recompensará.” Ou seja, trate bem os inimigos, deixe-os nas mãos de Deus e Ele se encarregará de agir e recompensar sua vida por isso. Como você gostaria de ser tratado quando erra? Com lei ou com misericórdia? Com justiça ou com misericórdia? Aliás, essa é a lei áurea ensinada por Jesus: “Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles, esta é a lei e os profetas” (Mt 7.12).

Toda amargura é desejo de vingança. Às vezes, não queremos abrir mão da amargura porque pensamos: “Mas se eu abrir mão, será que Deus realmente vai tratar com aquela pessoa? Será que ela terá o que merece?” No entanto, há dois princípios fundamentais na Palavra de Deus: GRAÇA e MISERICÓRDIA. Graça é receber algo que não merecemos; misericórdia é não receber algo que merecemos (o castigo). Deus nos ensinou a sempre agirmos com graça e misericórdia:

Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia (Mt 5.7).

Ide, pois, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifícios. Porque eu não vim chamar justos, mas pecadores.” (Mt 9.1)

Quando estamos ressentidos, temos a ilusão de que aqueles que nos magoaram têm mais chances de serem punidos se ficarmos concentrados na vingança, ou seja, temos medo de abandonar o sentimento de vingança e eles ficarem impunes. “Afinal, se não fizermos planos para garantir que a justiça seja feita, como ela será feita?” Acreditamos que cabe nós fazê-la acontecer. Mas Deus disse: “A vingança cabe a mim, eu lhes darei o troco.” Portanto, vamos abrir mão e, se necessário, vamos sofrer o dano, afinal, todo perdão é uma perda! O próprio Deus sofreu uma imensa perda ao dar seu único Filho para morrer em nosso lugar; Jesus não cometeu pecado algum e mesmo assim decidiu morrer por pecadores como eu e você.

Não entristeçam o Espírito Santo de Deus, o selo que ele colocou sobre vocês para o dia em que nos resgatará como sua propriedade. Livrem-se de toda amargura, raiva, ira, das palavras ásperas e da calúnia, e de todo tipo de maldade. Em vez disso, sejam bondosos e tenham compaixão uns dos outros, perdoando-se como Deus os perdoou em Cristo. Portanto, como filhos amados de Deus, imitem-no em tudo que fizerem. Vivam em amor, seguindo o exemplo de Cristo, que nos amou e se entregou por nós como oferta e sacrifício de aroma agradável a Deus. (Ef 4.30-32; 5.1-2)

O que “espanta” ou entristece o Espírito Santo é a amargura. Portanto, se queremos ser e viver cheios Dele precisamos limpar nosso coração de todo tipo de amargura. Ora, como é que vamos levar o evangelho para alguém, ou mesmo viver a vida cristã, se o Espírito Santo estiver entristecido dentro de nós? A única solução é o PERDÃO.

Então Pedro se aproximou de Jesus e perguntou: “Senhor, quantas vezes devo perdoar alguém que peca contra mim? Sete vezes?”. Jesus respondeu: “Não sete vezes, mas setenta vezes sete.” (Mt18.21,22)

Ou seja, PERDOAR SEMPRE. A história que Jesus relata a seguir (Mateus 18.23-35) é exatamente a nossa história. Nós tínhamos uma dívida impagável. Nunca poderíamos pagar a Deus por todos os nossos pecados, mas Jesus pagou por nós. Essa dívida estava nos levando para o inferno, para a perdição, para o afastamento total e eterno de Deus, mas Jesus a pagou em nosso lugar:

Vocês estavam mortos por causa de seus pecados e da incircuncisão de sua natureza humana. Então Deus lhes deu vida com Cristo, pois perdoou todos os nossos pecados. Ele cancelou o registro de acusações contra nós, removendo-o e pregando-o na cruz. (Cl 2.13,14)

Vocês estavam mortos por causa de sua desobediência e de seus muitos pecados, nos quais costumavam viver, como o resto do mundo, obedecendo ao comandante dos poderes do mundo invisível. Ele é o espírito que opera no coração dos que se recusam a obedecer. Todos nós vivíamos desse modo, seguindo os desejos ardentes e as inclinações de nossa natureza humana. Éramos, por natureza, merecedores da ira, como os demais. Mas Deus é tão rico em misericórdia e nos amou tanto que, embora estivéssemos mortos por causa de nossos pecados, ele nos deu vida juntamente com Cristo. É pela graça que vocês são salvos! (Ef 2.1-5)

Sendo assim, como é que não vamos perdoar algo infinitamente menor que alguém nos faz? Isso é algo muito sério e digno de juízo! No final da história acima, o texto diz:

Servo mau! Eu perdoei sua imensa dívida porque você me implorou. Acaso não devia ter misericórdia de seu companheiro, como tive misericórdia de você? E, irado, o senhor mandou o homem à prisão para ser torturado até que lhe pagasse toda a dívida. Assim também meu Pai celestial fará com vocês caso se recusem a perdoar de coração a seus irmãos (Mt 18.32-35).

Portanto, devemos ter esse temor, esse cuidado de estar sempre analisando o nosso coração: “Será que eu não estou retendo o perdão para alguém? Será que eu não tenho de pedir perdão para alguém?” Jesus disse que devemos fazer isso antes de chegarmos ao Juiz, ou seja, enquanto ainda estamos vivos (a caminho):

Portanto, se você estiver apresentando uma oferta no altar do templo e se lembrar de que alguém tem algo contra você, deixe sua oferta ali no altar. Vá, reconcilie-se com a pessoa e então volte e apresente sua oferta. Quando você e seu adversário estiverem a caminho do tribunal, acertem logo suas diferenças. Do contrário, pode ser que o acusador o entregue ao juiz, e o juiz, a um oficial, e você seja lançado na prisão. (Mt 5.23-25)

O texto ainda diz que não podemos sequer adorar (ofertar algo) a Deus se não perdoarmos. Ele não aceita nossas ofertas se estamos com pendências relacionadas ao perdão.

Da mesma forma, vocês, maridos, honrem sua esposa. Sejam compreensivos no convívio com ela, pois, ainda que seja mais frágil que vocês, ela é igualmente participante da dádiva de nova vida concedida por Deus. Tratem-na de maneira correta, para que nada atrapalhe suas orações. (1 Pd 3.7)

Pedro diz aos homens que se não tratarem bem suas esposas elas ficarão amarguradas e, com isso, as orações deles ficarão impedidas de ser respondidas. Deus é Pai e não gosta que nenhum de seus filhos estejam “de mal” com os demais.

Se vocês perdoam esse homem, eu também o perdoo. E, quando eu perdoo o que precisa ser perdoado, faço-o na presença de Cristo, em favor de vocês, para que Satanás não tenha vantagem sobre nós, pois conhecemos seus planos malignos. (2 Co 2.10,11)

Paulo está dizendo que, quando não perdoamos alguém, abrimos a porta (damos espaço) para Satanás agir. É por isso que muitas pessoas não progridem em nada na vida e estão sempre em dificuldades (saúde, finanças, família etc.).

No final do livro de Jó, lemos que ele se humilhou diante do Senhor e foi restaurado. Ele havia sido muito humilhado com toda aquela situação, mas, finalmente, se quebrantou diante de Deus. Em seguida, Deus foi tratar com os amigos de Jó:

Depois que o Senhor terminou de falar com Jó, disse a Elifaz, de Temã: “Estou muito irado com você e com seus dois amigos, pois não falaram o que é certo a meu respeito, como fez meu servo Jó. Por isso, peguem sete novilhos e sete carneiros, levem os animais a meu servo Jó e ofereçam holocaustos em favor de si mesmos. Meu servo Jó orará por vocês, e eu aceitarei a oração dele. Não tratarei vocês como merecem por sua insensatez, pois não falaram o que é certo a meu respeito, como fez meu servo Jó”. Então Elifaz, de Temã, Bildade, de Suá, e Zofar, de Naamá, fizeram o que o Senhor havia ordenado, e o Senhor aceitou a oração de Jó. Quando Jó orou por seus amigos, o Senhor o tornou próspero de novo. Na verdade, o Senhor lhe deu o dobro do que tinha antes. (Jó 42.7-10)

Durante muitos dias esses homens julgaram, acusaram Jó de ter feito muitas coisas contra o Senhor. No final, precisaram se humilhar e pedir a Jó que orasse por eles. Quando eu me quebranto, me humilho diante de Deus, estou pronto para suportar qualquer situação na vida. E o texto termina dizendo que “quando Jó orou por seus amigos, o Senhor o tornou próspero de novo”.

Jó perdoou de coração e abençoou aqueles que lhe haviam humilhado e feito mal. Aliás, a maior prova de que eu perdoei alguém é se desejo, do fundo do meu coração, que Deus abençoe aquela pessoa, independentemente do que ela tenha feito a mim, do quanto me magoou ou me fez sofrer; é quando eu não quero que ela sofra por isso, que não tenha nenhuma consequência pelos seus erros, mas que seja plenamente perdoada e abençoada por Deus. (*Isso não exime a pessoa de acertar contas com Deus. Orar pela pessoa e desejar o bem é importante para que nós mesmos fiquemos livres. Precisamos confiar inteiramente no Senhor que cuidará daquilo que não nos compete fazer.)

Peça perdão! Perdoe! Ore para que Deus abençoe aqueles que lhe fizeram algum mal! Quando assim o fizer, descobrirá que pode amar e evangelizar essas pessoas e, então, o Senhor trará cura, libertação e bênçãos para sua própria vida.

A irmã Célia contou-nos um testemunho maravilhoso nessa área de perdão, que relato resumidamente abaixo:

Eu já tive problemas com muitas pessoas, mas o maior deles até hoje foi com o marido da minha falecida filha, Talita. Devido a um histórico familiar muito difícil na infância, sempre tive uma grande dificuldade em perdoar as pessoas, até o dia em que o Senhor Jesus entrou na minha vida e começou a fazer uma limpeza interior, levando-me a perdoar e pedir perdão para muita gente.

Quando Talita faleceu, há 6 anos, passei por uma dor indescritível que somente uma mãe pode sentir. Por diversas razões que hoje não vem mais ao caso, eu culpei meu genro pela morte dela e por todos os problemas que vieram a seguir. Então cortei definitivamente o relacionamento com ele. Inclusive, comecei a formar uma “equipe” de irmãos da congregação que pudessem pensar como eu e se posicionassem também contra ele. Pessoas que talvez pudessem alimentar essa mágoa comigo e me apoiar. Isso porque uma pessoa cega pela mágoa sempre “arregimenta” outras para se condoerem com ela e apoiá-la; ela está tão cheia de ira que imediatamente busca outras que pensem e ajam como ela; não quer ficar sozinha nessa sua mágoa, mas disseminar calúnias e formar partidarismos contra as pessoas objetos de sua mágoa. É uma espécie de retaliação ou vingança.

Como ele frequentava a igreja conosco, diante dessa “equipe” que começou a lhe rejeitar, ele procurou outro lugar para frequentar. Essas pessoas, no entanto, sentiam a minha dor, me ajudavam, mas sabiam que “não era tanto assim” como eu falava, afinal, ele era um servo do Senhor.

Enfim, essa situação permaneceu me angustiando por 4 anos e meio. Nesse período fiquei doente inúmeras vezes, inclusive internada em uma U.T.I. Naquele lugar, sem entender o que acontecia comigo, eu pedia ao Senhor que me curasse de tudo o que me afligia, emocional e fisicamente. Eu dizia ao Senhor que havia perdoado meu genro, mas era mentira, porque eu sequer podia vê-lo. Evitava, inclusive, ir nos mesmos ambientes que eu sabia que ele estaria.

Foram anos muito difíceis e ruins, eu sofria muito com isso, mas comecei a entender que precisava falar com ele, pedir perdão e perdoar; porém, não sabia como fazer isso. Eu sabia que aquele meu perdão não era sincero e pedia muito ao Senhor que me enchesse com o amor e o perdão Dele, pois de mim mesma eu não conseguia. Naquela U.T.I. esse foi o meu maior motivo de clamor a Deus e, então, Ele viu uma disposição real e sincera em mim.

Passados alguns dias da minha recuperação, houve um aniversário de um jovem da igreja e eu sabia que ele iria. Foi, então, que tomei a decisão de ir também. Ele já estava casado com outra mulher, também cristã, e logo que eu o vi senti um amor muito grande por ele, algo humanamente inexplicável. Não havia mais ira, mágoa, ódio em meu coração – somente o amor de Deus. No entanto, eu não conseguia lhe abraçar ou falar qualquer coisa. Percebi que ele também ficava isolado e intimidado e sabia que era por minha causa. Mas não foi naquele dia que eu consegui restaurar a situação.

É fato que, quando não perdoamos, prejudicamos não somente a nós, mas também aqueles que não recebem nosso perdão. Muitos, inclusive, não conseguem crescer, prosperar em suas vidas, pois estão retidos, amarrados devido à nossa falta de perdão.

Mas o Senhor continuou incomodando muito o meu coração e, então, eu liguei para ele e o convidei para ir à minha casa. No princípio ele não acreditou, mas poucos dias depois ele foi. Logo que chegou, muito desconfiado, disse: “Eu nunca imaginei que você faria isso!” Mas aquela foi a noite do meu perdão e libertação. Houve muito choro, abraço e reconciliação. Um grande amor encheu meu coração por ele e hoje o considero, juntamente com sua esposa, como meus filhos. Minha saúde física, emocional e espiritual melhorou muito e hoje me considero livre dessa mágoa. Amém!

Concluo alertando a todos os que às vezes fazem partes dessas “equipes do mal”, que alimentam mágoas, rancores, inimizades contra pessoas que, muitas vezes, nem lhes fizeram nada, mas apenas para “estar ao lado de seus amigos”, que revejam suas posições, ou melhor, que se arrependam também deste terrível pecado. Como disse o escritor ao Hebreus:

Cuidem uns dos outros para que nenhum de vocês deixe de experimentar a graça de Deus. Fiquem atentos para que não brote nenhuma raiz venenosa de amargura que cause perturbação, contaminando a muitos. (Hb 12.15)

Transcrição e Edição: Luiz Roberto Cascaldi

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